Pesquisa Acadêmica

Pesquisa da UFLA mostra a influência dos memes nas pessoas

Pesquisa do Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Federal de Lavras (PPGA/UFLA) analisou como os consumidores habituais de memes são impactados na forma de diferenciação e busca por pertencimento a grupos sociais e na projeção de suas identidades. Buscou-se compreender também as percepções dos consumidores em relação à utilização de memes por empresas e marcas.

O meme é um tipo de conteúdo digital (imagens, vídeos, frases ou sons), geralmente cômico, que se espalha rapidamente e pode ser modificado para que se encaixe em determinadas situações cotidianas, sendo muito popular na internet.

Os resultados da pesquisa mostraram que os consumidores habituais de memes são bastante engajados, participando de grupos e seguindo perfis em redes sociais que tenham essa temática, e muitos têm o hábito de consumi-los durante todo o dia. “Eu acho que o meu dia fica diferente. Se eu acordo e não vejo um meme, eu falo ‘nossa, puxa vida, tá faltando alguma coisa’”, revela uma das entrevistadas, que teve o nome mantido em sigilo pelo protocolo da pesquisa.

O estudo evidenciou que a principal motivação para o consumo de memes foi a descontração, uma forma de lidar com o tédio, por ser um conteúdo leve e fácil de ser consumido. Ele é considerado também uma forma de escapismo, ou seja, um ponto de fuga da realidade e alívio das tensões cotidianas, que pode ser até mesmo uma distração de tarefas importantes, como trabalho e estudos. Por se tratar de uma piada rápida, também não exige tanta reflexão sobre a mensagem que é transmitida, gerando uma sensação de prazer instantâneo. Além disso, o meme pode assumir um caráter informativo, sendo considerado uma fonte de notícias sobre acontecimentos recentes.

As respostas dos entrevistados mostram que o público de cada tipo específico de meme pode variar de acordo com a faixa etária, orientação sexual, ocupação, localização geográfica e cultura local, classe social, rede social que utiliza e tempo disponível no dia para ver os memes. Diversos grupos sociais foram citados como consumidores desse conteúdo, porém, os que tiveram maior destaque foram os jovens, devido à facilidade em lidar com tecnologias e ficarem on-line por bastante tempo, além da comunidade LGBTQIAPN+.

Influência 

Os entrevistados afirmaram que os memes influenciam até mesmo suas falas e comportamentos, sendo utilizados no dia a dia, muitas vezes de forma inconsciente. Alguns disseram, ainda, que sentem necessidade de expressar um meme quando surge a oportunidade, o que lhes gera grande satisfação pessoal, visto que isso demonstra seu alto envolvimento com essa tendência.

Há um constante investimento na busca por atualizações desses conteúdos, como forma de atingir a inclusão social e evitar uma defasagem no nível de conhecimento dos consumidores.

De acordo com a pesquisa, a identificação com o conteúdo apresentado é fundamental para o compartilhamento dos memes. Por meio da interação, os indivíduos podem perceber se uma outra pessoa está familiarizada ou não com determinado meme, de acordo com sua compreensão e contextualização de forma correta. Os participantes da pesquisa revelaram realizar julgamentos sobre o conhecimento e os gostos alheios a partir do que consideram memes bons (engraçados, reflexivos e identificáveis) ou ruins (ofensivos ou sem sentido), na expectativa de obter principalmente a aprovação de terceiros, a distinção, ao serem considerados especialistas no assunto, e o pertencimento ao grupo. Apesar de julgarem, os entrevistados também têm receio de serem julgados ou sentirem-se constrangidos caso não entendam um meme. 

A pesquisa mostra que o conhecimento em memes é uma característica considerada desejável por determinados grupos, que facilita a aquisição e manutenção das relações do indivíduo. Os memes refletem estruturas culturais e sociais profundas, legitimando relações sociais e fortalecendo laços entre membros do grupo. Por meio do estudo pode-se perceber uma conversão do capital cultural em capital social, colaborando com a construção da identidade desejada pelos consumidores de memes.

Marketing

Percebendo essa realidade, as marcas estão investindo cada vez mais na utilização desse tipo de conteúdo em suas campanhas de marketing e vendas. Os entrevistados afirmaram perceber e aprovar essa estratégia, que se aproxima do público, transmitindo uma sensação de amizade, e utilizando uma linguagem informal, mais humana e bem-humorada. Para eles, esse posicionamento da marca atrai a atenção do cliente e faz com que ela se diferencie da concorrência.

Um dos entrevistados salienta as mudanças por parte das marcas na maneira de se comunicar com o público, visto que alguns anos atrás, na época em que milhões de pessoas assistiam à televisão, era comum o uso de jargões e jingles, por exemplo, em comerciais. Para ele e outros entrevistados, esse tipo de estratégia já não é tão eficiente quanto outrora, já que não alcança um público tão grande quanto outras estratégias e gera menos engajamento nas redes sociais.

Ao utilizarem memes, as marcas conseguem interagir com seu público, gerar engajamento em suas publicações e transmitir confiança devido à impressão de serem atualizadas em relação às tecnologias e redes sociais, solucionando, assim, os problemas do cliente mais rapidamente. Tudo isso gera a identificação entre cliente e marca.

Apesar da comunicação por meio de memes não ser o único requisito avaliado para a decisão de compra, há grandes chances de o consumidor ser influenciado devido ao seu gosto pessoal. “Eu acho maravilhoso, porque assim, é o capitalismo, né? Tem que criar identificação, tem que fazer a gente comprar. Então, assim, gente, é muito mais fácil você fazer a pessoa comprar se ela estiver rindo e felizinha. Você já tá ali cativando o seu cliente porque ele gosta de meme”, comenta um dos entrevistados da pesquisa.

Segundo os participantes, um produto de qualidade, bom preço e uma estratégia atraente podem levar à fidelidade à marca, com consumidores envolvidos colaborando com a disseminação de seu conteúdo.

Origem do Meme

Apesar de ter sua ascensão nos últimos 10 anos, a origem da palavra meme é da década de 1970. O termo foi criado pelo biólogo evolucionista Richard Dawkins, em 1976. A palavra foi citada no livro “O Gene Egoísta”, no qual, segundo o autor, representava uma nova forma de gene do cérebro que poderia se propagar por réplicas para sobreviver.

A ideia do autor era relacionada aos processos de replicação e evolução cultural de ideias, propondo uma espécie de evolucionismo cultural. Em uma entrevista para o site Wired, Dawkins disse:

“O significado (do meme) não está distante do original. É qualquer coisa que se torna viral. Na introdução original da palavra ‘meme’ no último capítulo do livro O Gene Egoísta eu usei a metáfora de um vírus. Então, quando alguém diz que algo se tornou viral na internet, isso é exatamente o que um meme é, e parece que se a palavra se tornou apropriada para isso.”

Equipe e metodologia

A pesquisa faz parte da tese de doutorado de Alyce Cardoso Campos, sob orientação do professor da Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas (FCSA/UFLA) Daniel Carvalho de Rezende. “Os memes ocupam grande parte do dia dos brasileiros e possuem forte papel na comunicação global, ganhando novos significados e funções na cultura digital. A internet possui dinâmicas próprias, mas representa grande parte do que acontece na sociedade, sendo uma boa ferramenta para analisar fenômenos sociais”, comenta Alyce.

O estudo teve início em março de 2020. Primeiramente, definiu-se que a pesquisa seria de caráter qualitativo e descritivo, apoiando-se na Teoria da Cultura do Consumo, que consiste em uma escola de pensamento que busca estudar o consumo a partir de um ponto de vista social e cultural. Em seguida, foram selecionados os sujeitos da pesquisa, com os critérios: a) consumir/compartilhar/disseminar memes diariamente, apresentando alto envolvimento; b) autodeclarar-se e ser reconhecido pelos seus pares como grande conhecedor de memes da internet (sendo indicados por entrevistados anteriores e pelas sementes do estudo); e c) reconhecer ser um conteúdo importante no seu dia a dia. Foi utilizada a amostragem bola de neve até atingir o ponto de saturação, quando a obtenção de informações tornam-se redundantes.

A etapa seguinte foi a coleta de dados. Foram realizadas 27 entrevistas em profundidade, que ocorreram entre janeiro e março de 2023, utilizando um roteiro semiestruturado. As entrevistas foram realizadas de forma presencial ou por videochamada, de acordo com a preferência do participante. Os entrevistados apresentaram média de idade de 26 anos, dos quais 48,1% são mulheres e 51,9%, homens. Com relação ao estado civil, 85,2% são solteiros e 14,8% casados. A escolaridade predominante foi a de ensino superior em andamento (37%), seguida de superior completo (29,6%), pós-graduação completa (22,2%) e pós-graduação em andamento (11,1%). A última etapa foi a análise dos dados. As entrevistas foram transcritas e analisadas com base na técnica de análise de conteúdo de Bardin (1977), utilizando grade mista, em que as categorias foram pré-estabelecidas de acordo com os objetivos do estudo e o referencial teórico utilizado, sendo adaptadas durante o processo de análise dos dados. O estudo foi finalizado em julho de 2023.

Foto: Reprodução Internet

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